TJBA 14/02/2023 -Pág. 926 -CADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA -Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.276- Disponibilização: terça-feira, 14 de fevereiro de 2023
Cad 3/ Página 926
É o resumo do essencial.
Fundamento e decido.
DA PRELIMINAR
Prescrição Trienal
Rejeito a preliminar, pois a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça se firmou no sentido de considerar o período de cinco
anos como prazo prescricional e como termo inicial o último desconto do mútuo da conta/benefício da parte autora.
Ausência de pretensão resistida.
Rejeito a preliminar, pois a parte não pode ser obrigada a tentar primeiro contato administrativo, vez que, restaria configurada
restrição de acesso à justiça.
Inépcia
Não há que se falar em inépcia visto que o objeto da ação é a regularidade ou não do contrato de empréstimo realizado entre as
partes o que está em conformidade com o pedido.
Conexão
Reconheço a conexão, por isto passo ao julgamento em conjuntos dos processos 8001605-04.2019.8.05.0052; 800161548.2019.8.05.0052; 8001614-63.2019.8.05.0052; 8001613-78.2019.8.05.0052; 8001610-26.2019.8.05.0052 e 800160419.2019.8.05.0052.
DO MÉRITO
Não há dúvidas de que são aplicáveis as regras insculpidas no Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados pelas
instituições financeiras, por expressa previsão contida no parágrafo 2º do art. 3º do referido diploma legal, o qual enquadra expressamente a atividade bancária, financeira e de crédito como fornecedor.
A parte autora afirma que nunca contratou a operação de empréstimo consignado. Por sua vez, o demandado sustenta a regularidade da contratação.
Da análise dos autos, verifico que a parte autora é analfabeta.
O Requerido, apesar de contestar a ação, deixou de trazer aos autos o contrato assinado pela parte autora, deixando de comprovar o negócio jurídico havido entre as partes.
Entretanto, ainda que fosse juntado o contrato formalizado e comprovada a transferência do valor para a conta bancária da parte
autora, o banco acionado negligenciou quanto à obrigatoriedade de realizar contrato com analfabeto por instrumentos públicos
de procuração, sendo necessário o cancelamento do contrato, em razão da sua pouca ou quase nenhuma instrução.
Ressalva-se que, esses consumidores celebram negócios sem terem conhecimentos mínimos das regras que regerão o contrato, como também sem calcularem o custo efetivo total da operação de crédito. A verdade é que muitos sequer sabem efetuar
uma operação simples de matemática, quanto mais operações como essa. Em razão disso é que esses consumidores merecem
uma proteção especial, com o fito de garantir-lhes que tiveram ciência no ato da contratação das implicações que adviriam do
quanto pactuado.
Assim é que vem se formando o entendimento na doutrina e jurisprudência pátrias de que o negócio jurídico celebrado com pessoa analfabeta só é válido se o for por procuração pública. Isso, com o fito de garantir a observância aos comandos legais mencionados anteriormente, como também ao art. 166, V, do Código Civil, o qual considera nulo o negócio jurídico quando preterida
alguma solenidade que a lei considere essencial a sua validade. Ora, sendo a parte autora analfabeta e, portanto, impossibilitada
de assinar o instrumento particular e, consequentemente, de entender as reais implicações da negociação, a escritura pública
torna-se essencial à validade do contrato de empréstimo firmado entre as partes.
Dispõe o art. 221, do Código Civil, que “o instrumento particular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja na livre
disposição e administração de seus bens, prova as obrigações convencionais de qualquer valor; mas os seus efeitos, bem como
os da cessão, não se operam, a respeito de terceiros, antes de registrado no registro público”.
Assim, a cobrança é indevida e deve ser devolvidos os valores cobrados, de forma simples, não há que se falar em compensação
uma vez que não fora comprovada a regularidade de transferência bancária. Portanto, deve a autora devolver os valores recebidos, descontando os valores que o banco réu debitou em sua conta.
No que se refere aos danos morais, evidente a incidência na hipótese e, por consequência, presente o dever de indenizar.
A verba indenizatória a título de danos morais deve ser fixada tendo em vista dois parâmetros: o caráter compensatório para a
vítima e o caráter punitivo para o causador do dano.
Para a vítima, este caráter compensatório nada mais seria do que lhe ofertar uma quantia capaz de lhe proporcionar alegrias que,
trazendo satisfações, pudesse compensar a dor sofrida.
Os fatos narrados trouxeram circunstância de elevada repercussão na vida do autor, ou seja, uma conduta que beira o estelionato, que gera o desgosto de ser enganado, além do desconto ilegal e indevido.
Teve a sua ingenuidade e humildade explorada, tornando-se presumida a dor que lhe foi causada.
No tocante ao ofensor, o caráter punitivo tem uma função de desestímulo no sentido de demonstrar que aquela conduta é reprovada pelo ordenamento jurídico, de tal sorte a que não volte a reincidir no ilícito.
Por outro lado, afastar a indenização por dano moral, deixando de se considerar o caráter punitivo, significaria incentivar ao
banco a perpetuação de sua conduta.
Não é essa a resposta que a sociedade de Casa Nova espera do Poder Judiciário, nem a conduta pelo réu que a nossa sociedade espera dos seus bancos e comerciantes.
Ademais, nas contas do réu, o prejuízo material em agir da forma que arquitetou com seus representantes é pequeno, o que torna
a empreitada extremamente vantajosa, sem considerar aqueles que por desconhecimento ou comodismo, deixam de buscar a
Justiça.
Assim, dentro desse contexto, o valor da indenização deve ser razoavelmente expressivo. Não deve ser simbólico e deve pesar
sobre o bolso do ofensor como um fator de desestímulo a fim de que não reincida na ofensa. Assim, há de se levar em consideração, frente ao caso concreto, não somente angústia e o sofrimento da vítima, mas, principalmente, a potencialidade do ofensor: